O que procuro em ti, eco ou planície, que não me respondes? Porque devolves apenas a minha voz?

sábado, 29 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #145

Voltei ontem das Terras de Além (Tejo), como choveu está tudo verde, já há pasto para os animais, ao contrário do ano anterior. A acompanhar os verdes esteve um belíssimo sol de Inverno. Agora por aqui em Lisboa sinto mesmo que vim de Marte.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #144


Da experiência de combate pela qual passei recentemente, falta apenas contar-vos a história da D. Vitória: era uma anciã que tinha algo da D. Secundina, do “ Mau Tempo no Canal” porque como diria Vitorino Nemésio “(…) a velha falava assim naturalmente, sem ódio nem queixas, como quem chama pelos verdadeiros nomes as espécies da fauna de um país de que é simples explorador e que está quase a largar.” Ela era de facto rija e horrível em simultâneo, não estava tão surda como o personagem e seria um pouco mais nova, rondava os oitenta anos. Eu simpatizei mal lhe ouvi os roncos peculiares que animavam a enfermaria. Das primeiras vezes que lhe ouvi a voz, estava já ela a mandar vir com o enfermeiro João, porque queria colocar a sua esquelética na boca. A primeira vez que me dirigiu a palavra foi bonito: eu estava a conversar com a Luísa, uma simpática enfermeira que ficou na cama ao lado da minha, internada de urgência e seria operada no dia seguinte. Trocávamos ideias sobre as experiências das anestesias e oiço assim muito alto: Olha! Esta não diz coisa com coisa. Como sabem, é difícil rir num pós-operatório, a D. Vitória era perigosa nesse sentido. Ela passava o tempo a mandar vir com o enfermeiro João que era um típico beirão, na casa dos quarenta anos, gorducho e entroncado, poucas falas e muito competente. Ela lá no fundo deveria de achar que aquilo não era sítio para homens e o desgraçado apanhava por tabela, mas o João era tão boa pessoa, que voltava costas, encolhia os ombros e ria-se. Se lhe traziam chá ela praguejava, dizia que não bebia aquela merd…, também não gostava de iogurtes, estava revoltada porque tinha trazido uma caixa com os seus medicamentos todos organizados e não lhos davam a horas. Depois, levantava-se da cama sozinha, não queria ajuda e arrancava com dores a quinta a fundo para a casa de banho, uma força da natureza. Uma das vezes tomou um pouco de chá com os comprimidos e vomitou. E lá apareceu o anjo de nome Clara, que a acalmou dizendo, tem toda a razão D. Vitória, eu é que a convenci a tomar chá, eu já não lhe trago mais. A Clara era assim, e depois limpou a porcaria toda. De seguida tentou animá-la: D. Vitória conte-nos lá, a suas amigas ainda não sabem que tem um pretendente lá no lar. A D. Vitória respondeu: é um velho de bengala, ele não tem piada nenhuma e outro dia quis roubar-me um beijo, mas ele mete-se com todas; eu fiquei viúva aos trinta e seis anos e nunca mais me interessei por essas coisas. Mas a situação mais cómica de todas foi quando o enfermeiro João se dirigiu a ela, com muito cuidado para lhe dizer que era necessário fazer um clister e depois saiu da enfermaria para ir buscar o material. A D. Vitória comentou bem alto: ENTÃO ESTE AGORA QUER IR-ME AO …?

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Poema #90

POEMA DE NATAL



Para todos os leitores do Insónia


Naquele tempo as luzes duravam toda a
noite. Mas faltava-lhes a eléctrica eficácia de
quem chama, vinde todos comprar um souvenir,
reis magros, corretores da bolsa, funcionários
e teleguiadas tias por estrela que conduz aos
mares do sul, cristãos e bronzeados, a minha vida
dava um filme. Nem sabe o que me aconteceu, o
vestido da Senhora não traz instruções de lavagem
e a vaquinha de polietileno engorda sozinha, eu próprio
já não sinto os olhos de tanto ver as luzes acender e
apagar. Mas uma coisa é certa: Jesus se fosse vivo
havia de ter um partido, ler os tops da Fnac e saber
de cor o nome de todos os ministros. Havia de
sair de casa pela porta da frente, cumprimentar
os jornalistas e conceder duas medidas correctivas dos
excessos do capitalismo; depois, no último degrau
levantaria a palma de sua mão direita e os passantes,
subitamente inundados de um fulgor renascido,
estugariam o passo e entrariam no metro, sorrindo,
acreditando um pouco mais no reino
que tarda a ter um fim.


Rui Costa

In Insónia, 18/12/2007 (aqui)
 
Obrigada Henrique

Dia-a-dia #143

O pessoal da edp é tão simpático, acabaram-me agora de ligar a dizer que tinham sido devolvidas várias cartas com facturas que me tinham enviado. Pois, respondi que era tarde, que ontem me tinham cortado a electricidade sem aviso, já tinha tratado de tudo, já tinha electricidade. A moça ao telefone pediu muita desculpa, disse que houve problemas de comunicação dentro da empresa. Ainda tive para co...mentar que isso se devia a problema linguisticos, de tradução português-chinês, mas não quis ser politicamente incorrecta. Expliquei-lhe que apesar de me encontrar num pós-operatório já tinha tratado de tudo, mas assim que estivesse melhor me dirigia à empresa para fazer a reclamação por escrito que a situação merece. E que já sabia do actual mau funcionamento dos ctt na regiãode Lisboa, e que o meu caso não tinha sido o único, que os ctt também vão levar com a devida reclamação. Despedi-me desejando-lhe boas festas. Acho que de futuro vamos receber estes telefonemas da edp em chinês para ninguém entender (antes ou depois de cortarem a electricidade com multas).

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #142

Hoje de manhã fui acordada por dois funcionários da edp que me cortaram a electricidade, devido à falta de pagamentos. Maravilhosos, tudo isto porque não recebi as facturas pelo correio, aliás, tenho tido problemas vários com entregas de cartas de há um ano para cá. Já fiz uma reclamação o ano que passou nos correios por causa disso, mas a maluquise continua. Entretanto, apanhei um taxi e fui à sede da edp, expliquei-lhes que estou num pós-operatório, que não posso estar em casa sem electricidade, que a minha irmã está a trabalhar não pode estar ali. Enfim, mudei os processos de pagamento, vou passar a fazer tudo pela internet, paguei a dívida que não era nada de outro mundo e fiz pressão para que viessem hoje ligar-me a electricidade. Estou à espera, porque se calhar só vêm amanhã. Este país está bonito está, quando estiver melhor vou reclamar na edp e nos correios. Se calhar não adianta nada, mas calada não fico. Hoje tratei tudo diplomáticamente e evitei irritar-me, que ainda se abria aqui algum ponto da cicatriz e era perigoso.


segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Poema #89

E porque hoje é o aniversário de Fernando Lopes -Graça, aqui vos deixo um ciclo de peças "velhacas" deste compositor, apelidadas assim pelo próprio devido a serem dificeis. São as " Três Líricas Castelhanas" de Luís de Camões, ao clicarem nos títulos de cada uma poderão escutá-las interpretadas pelo meu coro, o Coro de Câmara da Universidade de Lisboa, dirigido por José Robert em 2006

OJOS, HERIDO ME HABÉIS...
 
mote:

Ojos, herido me habéis,
acabad ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.

 voltas:

Pues me disteis tal herida
con gana de darme muerte,
el morir me es dulce suerte,
pues con morir me dais vida.
Ojos ¿qué os detenéis?
Acabad ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.

La llaga, cierto, ya es mía,
aunque, ojos, vos no querráis;
mas si la muerte me dais,
el morir me es alegría.
Y así digo que acabéis,
oh ojos, ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.

DE VUESTROS OJOS CENTELLAS

mote:

De vuestros ojos centellas,
que encienden pechos de hielo
suben por el aire al cielo,y en llegando son estrellas.

voltas:

Falsos loores os dan,
que essas centellas tan raras
no son nel cielo más claras
que en los ojos donde están.
Porque cuando miro en ellas
de como alumbran el suelo
no sé que serán nel cielo;
mas sé que acá son estrellas.

Ni se puede presumir
que al cielo suban, Senora,
que la lumbre que en vos mora
no tiene más que subir;
mas pienso que dán querellas
a Dios nel octavo cielo,
porque son acá en el suelo,
dos tan hermosas estrelas.

DO LA MI VENTURA

mote:

Do la mi ventura,
que non veo alguna.

voltas:

Sepa quién padece
que en la sepultura
se esconde ventura
de quién la merece.
Allá me parece
que quiere fortuna
que yo halle alguna.

Naciendo mezquino,
dolor fué mi cama;
tristeza fué el ama,
cuidado el padrino.
Vestióse el destino
negra vestidura:
huyó la ventura.

No se halló tormento
que alli no se hallasse;
ni bien que pasase,
sino como viento.
Oh, que nacimiento,
que luego en la cuna
me seguió fortuna!

Esta dicha mía
que siempre busqué,
buscandola, hallé
que no la hallaría;
que, quién nace en día
d'estrella tan dura,
nunca halla ventura.

No puso mi estrella
más ventura en mi;
así vive en fin
quién nace sin ella.
No me quejo della;
quéjome que atura
vida tan escura.


Luís de Camões

Dia-a-dia #141

Quando acordei da cirurgia na enfermaria onde estive internada recentemente, havia um enorme movimento e as camas estavam todas ocupadas, ao contrário da véspera da operação, onde apenas eramos três por lá. Isso acontece porque hospital onde estive tem urgências que funcionam bem, mal era detetado um problema em alguém, automaticamente era realizado o internamento e a intervenção. Foi o caso da minha companheira do lado, a Luísa, uma simpática enfermeira de Gouveia, da Marta, que estava na cama ao lado da Luísa, e também da D. Beatriz, que ficou na cama entre a Fernanda e a D. Vitória. Só eu, a Fernanda e a D. Vitória tivemos cirurgias marcadas com antecedência. A fragilidade física e psicológica em que todas nos encontrávamos fez com que partilhássemos vivências, sobretudo quando tomávamos as nossas refeições em conjunto, sentadas nas mesas entre as camas da enfermaria. Eramos muito diferentes, com problemas vários e em faixas etárias diversas, mas estávamos ali numa experiência a que apelidei de combate. Numa altura onde se fala em reduzir o número de camas nos hospitais públicos e que o estado social se encontra ameaçado eu pergunto-me: o que de futuro poderia acontecer àqueles três casos que foram internados de urgência, se não existissem camas vagas para elas? É revoltante, uma cama num hospital público não é apenas um número, corresponde sim a uma vida humana, que é tratada e salva.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #140


 

Como hoje é domingo, vou falar-vos de um dos anjos com que me cruzei no hospital, onde fiquei recentemente internada em Coimbra. Era uma auxiliar de idade indefinida, andava entre os trinta e os quarenta, mas havia algo de infantil nela, no seu sorriso doce e nos olhos verdes muito brilhantes. Tinha também um modo especial de lidar com as anciãs que estavam internadas naquelas enfermarias, sobretudo com os casos difíceis. Chamava-se Clara. Ela começou por se meter comigo por causa das minhas pantufas, que são uns croques vermelhos felpudos. Ora, nos hospitais toda a gente trabalha de croques e ela achou imensa piada à versão confortável que eu tinha nos pés. Eu lá lhe contei que os tinha arranjado numa loja em Lisboa, que tem uma vaca enorme à porta. Encontrava-a sempre no corredor das enfermarias, normalmente, a transportar alguma anciã em cadeira de rodas na direção da casa de banho, sempre na brincadeira com elas e a animá-las, uma maravilha. Como no hospital tudo estava bem aquecido, andava por lá de pijama, não era necessário colocar o robe. Mas quando comecei a dar umas escapadelas lá fora para fumar cigarrinhos, colocava o meu robe vermelho com capuz, que é bastante quente. A primeira vez que a Clara me apanhou nessa figura, meteu-se logo comigo, perguntou-me onde é que eu ia tão chique, com um robe a condizer com os croques. Respondi-lhe que ia lá fora fumar um daqueles cigarros que sabem a ar e que tem 0.1 de nicotina. Ela riu-se e comentou que não percebia nada de cigarros, mas se eram daquele muitos fininhos me ficavam bem, porque eram parecidos aos que as senhoras fumavam nos filmes antigos. Voltando ainda ao facto de este anjo animar as difíceis anciãs, na véspera da operação, à noite fizeram-me uma preparação para limpar o intestino e andava eu no corredor às voltas há espera de efeitos, quando passou a Clara com uma anciã de cadeira de rodas. A anciã com uns olhos muito vivos começou logo a meter-se comigo, a mandar bocas do estilo: então, anda aqui a fazer ginástica a essas pernas? Ao que respondi, que andava às voltas a ver se funcionava. A Clara abanou a cabeça e comentou que ela não ouvia e depois gritou-lhe: ELA ESTÁ A VER SE CONSEGUE FAZER COCÓ e foram as duas embora a rir à gargalhada.

sábado, 15 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #139


A principal diferença de uma operação num hospital privado ou num público é que no segundo ficamos numa enfermaria. De resto, como podem verificar nos meus anteriores relatos, estão de volta de nós pessoas competentes e infelizmente também podemos ter o azar de nos cruzarmos com algum ser daqueles que agora não vou classificar. Na véspera de ser operada na semana passada, entrei de manhã pela primeira vez na enfermaria onde fiquei. Tinha apenas duas das seis camas ocupadas, onde dormiam duas mulheres. Fui com a minha mãe e fomos guiadas por uma enfermeira amorosa, que indicou qual era o meu armário, me deu a escolher a cama. Preferi ficar junto da janela. Arrumei as coisas, despedi-me da minha mãe que foi almoçar e só voltou à tarde. Passado um bocado, a Fernanda que estava na cama em frente à minha, acordou e também a Teresa, que estava na cama ao lado. A Fernanda estava quietinha pois tinha sido operada na véspera, aparentava ser da minha idade. A Teresa levantou-se logo e contou-me que em princípio ia ter alta nesse dia. Depois chegou a D. Vitória, acabada de ser operada. E também o nosso almoço que foi colocado nas mesas entre as camas. A Fernanda, então, começou a movimentar-se com alguma dificuldade e eu e a Teresa ajudámo-la a sair da cama. Era rija e dizia que só se sentia bem sentada na cadeira, direita, preferia essa posição a estar deitada. O meu almoço e o da Fernanda era um caldo de galinha deslavado, um sumo e um iogurte. A Teresa já tinha direito a uma refeição completa, com esparguete e tudo. Começamos assim a conversar ao som dos cómicos roncos da D. Vitória, que até a ressonar tinha uma personalidade peculiar. Depois do almoço a Teresa teve alta e foi-se embora com o marido. Foi então que fiquei só com a Fernanda, que depois da sesta e da minha mãe me visitar outra vez, a pouco e pouco foi falando dela. Acho que ganhou confiança comigo, porque eu a ajudava sempre a sair da cama, mal notava que era necessário e ela não queria tocar à campainha para chamar a enfermeira, não tinha feitio para pedir ajuda. A Fernanda tinha sete filhos e trabalhava numa fazenda perto de Tomar com o marido. Eu estranhei o termo fazenda, por ser brasileiro, pensei que seria uma quinta, mas não comentei nada. Contou-me que dos cinco filhos mais velhos, que eram do primeiro marido, três já não viviam com ela, trabalhavam e já tinham as suas vidas. Em casa tinham ficado duas raparigas mais velhas a tomar conta dos dois rapazes mais novos, um com onze anos e o outro, que era muito rabino, com seis. Tinha ficado também o pai dos rapazes que era o seu segundo marido. E nisto pediu-me um favor: foi buscar um papel e pediu-me para eu lhe ler o que lá estava. Contou-me que não sabia ler, só sabia escrever o nome dela. O papel era um folheto informativo do hospital, onde descrevia a operação à qual ela tinha sido submetida. Estávamos as duas sozinhas na enfermaria e a D. Victória roncava. Li-lhe o texto mas sempre que tropeçava num termo técnico que não entendia comentava: sabe, eu sei ler mas não entendo tudo o que aqui está, já viu este palavrão? Ela ria um pouco aflita por causa da cicatriz na barriga que lhe dava dores. Continuamos uma boa vizinhança nesses dias de combate e ajudámos-mos mutuamente, com confiança uma na outra. Só contei à minha mãe que ela não sabia ler quando saímos do hospital, a minha mãe ficou em estado de choque, achava que ela já poderia ter aprendido, por causa dos filhos. Mas não, a Fernanda era pouco mais velha que eu, tinha 48 anos e não sabia ler nem escrever.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #138


Na semana passada a experiência de estar internada foi muito diferente da primeira vez, pois estive num Hospital Público em Coimbra. Em vez de um quarto individual fiquei numa enfermaria com seis camas e lá fora estava um corredor com várias enfermarias. Não me lembro de acordar no recobro, lembro-me de já estar na enfermaria, de ver a minha mãe e pedir-lhe para o meu pai ir à farmácia comprar umas esponjas para colocar nos ouvidos, pois estava imenso barulho. Depois apareceu o Manuel A. Domingos, que me ofereceu um livro de poemas seus. Quando o meu pai apareceu com as esponjas para o silêncio, consegui finalmente descansar. No dia seguinte é que foi pior: apareceu-me um ser antipático à frente, perguntou-me que dor sentia numa escala de 0-10, ao que respondi 4. O ser informou-me que tinha de me mexer da cama para ir tomar banho. Ao primeiro movimento, a escala das dores aumentou vertiginosamente, e disse-lhe para desaparecer da minha frente, que não a queria ver nunca mais. Nisto apareceu a minha mãe, estava eu lavada em lágrimas a queixar-me de que não me conseguia mexer. O ser reapareceu e disse à minha mãe que não podia estar ali àquela hora, as visitas só começavam às 14h. Saíram então as duas da enfermaria, na altura não sei o que falaram. Depois surgiram duas auxiliares amorosas que me explicaram como me podia mover e me ajudaram a sair da cama e sentaram-me numa cadeira de rodas. Apareceu aquele ser outra vez e disse-lhe algo como deve achar que eu tenho obrigação de saber como isto se faz, não? Olhe que nunca passei por uma situação destas. E mais uma vez lhe disse para desaparecer da minha frente, que não a queria ver nunca mais. As auxiliares levaram-me para a casa de banho e iniciaram a higiene com imenso cuidado. De vez em quando lá via também o ser com ar de quem comandava as operações. Nisto desfaleci e lembro-me de acordar no chão e ouvir, não sei se estaria a sonhar, que talvez eu seria epilética. Estavam várias pessoas em meu redor. Disse-lhes que não sou epilética, costumo é ter sempre a tensão muito baixa. Perguntaram-me se costumava desmaiar ao que respondi que a última vez foi quando saí da consulta médica onde me diagnosticaram o meu problema, e que ao balcão quando estava a pagar a consulta, desmaie e vomitei sem dar por nada, foi provavelmente um ataque de pânico. Depois, já deitada na enfermaria apareceu a minha mãe, contei-lhe o sucedido. Ela contou-me, furiosa, que ontem lhe tinham dito que poderia lá estar por volta das 11h para falar com a médica de serviço para obter informações da minha operação, mas que a enfermeira, aquele ser que detestei, a tinha mandado para a sala de espera lá fora, dizendo-lhe que alguém depois a ia chamar; e que tinha ficado ali até à hora das visitas e ninguém lhe tinha dito nada. Como eu sabia o nome do ser, disse à minha mãe para se dirigir à primeira sala antes das enfermarias, pois estava lá um administrativo muito simpático e competente em quem se podia confiar. A minha mãe foi lá fazer queixa do ser horrendo. Ainda me cruzei mais uma vez com o ser durante esta experiência de combate: ela acordou-me noutra madrugada e perguntou-me novamente como classificava a dor numa escala de 0-10. Respondi-lhe 3, porque estava quieta na cama, agora se me movia… Então ela deu-me dois comprimidos de paracetamol para tomar e respondi-lhe que esperava pelo pequeno-almoço, porque não engolia aqueles cachuchos em jejum.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #137


Os amigos próximos conhecem o meu acordar peculiar. De facto, nem sempre sou pacífica nesta coisa de passar do mundo dos sonhos para a realidade. E lidar com estranhos nestas situações pode ser perturbador. Isto a propósito ainda das cirurgias onde fui submetida a anestesia geral. Por uma questão de discrição não vou referir os nomes dos hospitais, nem os nomes das pessoas. A primeira vez foi num hospital privado no Porto. Lembro-me de acordar na maca em movimento e o meu médico me estar a dizer que tinham demorado um pouquinho mais porque tinham dado uns pontinhos na minha hérnia do hiato, que estava em mau sítio. Depois recordo-me de acordar no recobro e de lá estar uma enfermeira pouco simpática à qual me queixei de dores e ela não me ligou. Passado um bocado insisti e perguntei que me tinham colocado alguma coisa no soro e ela disse que sim. Passado um bocado comecei mesmo a ficar aflita e vieram mais pessoas, fizeram-me uma massagem e adormeci. Depois fui acordada por uma miúda amorosa, no quarto individual onde passei a noite, que me convenceu a beber um chá. Durante a noite foi assim, ora fechava os olhos e tinha a sensação que sonhava a alta velocidade, ora era acordada por este anjo, ou por um enfermeiro, que era de Elvas, ambos amorosos, que me convenciam a beber um sumo, um chá ou água. De manhã, uma enfermeira muito simpática ajudou-me a tomar um banho de gato e tudo correu bem. Quando ela se foi embora, aproveitei para fazer algo muito proibido: fumar um cigarro à janela. Depois adormeci a pensar que mais um bocado, os meus pais estariam lá para me irem buscar. Nisto fui acordada por aquele ser que tinha visto no recobro, que entrou disparada no meu quarto a dizer que tinha de lá sair antes do meio-dia, que devia decidir se queria lá ficar mais uma noite internada ou não. Perguntei-lhe as horas, eram dez horas da manhã. Disse-lhe que estava à espera dos meus pais para poder ir falar com o meu médico e referi qual era. O ser saiu do quarto à mesma velocidade com que entrou. Eu com alguma dificuldade levantei-me da cama e fui pelo desconhecido hospital procurar onde estaria o meu médico. Alguém me encontrou num corredor e acalmou-me, referindo que o meu médico já falaria comigo e levou-me para o quarto onde esperei pelos meus pais e pela alta que me foi dada.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Poema #88

SALADA PRIMITIVA

Leitor, se amas o campo e a natureza,
Se és bucólico e rude,
E na tua rudeza
Só respeitas a força e a saúde;
Se às convenções da sociedade opões
O desdém pelas normas e preceitos,
Que trazem pelo mundo contrafeitos
Cérebros e corações;

Se detestas o luxo e se preferes,
Francamente, às senhoras as mulheres,
E tens, como um pagão da velha Esparta,
Pulso rijo, alma ingénua e pança farta;
Se és algo panteísta e tens bem vivo
Esse afagado ideal
Do retrocesso ao homem primitivo,
Que nos tempos pré-históricos vivia
Muito perto do lobo e do chacal;
Se um ligeiro perfume de poesia
Que se ergue das campinas
Na paz, no encanto das manhãs tranquilas,
Te dilata as narinas
E enche de gozo as húmidas pupilas,
Leitor amigo, se assim és, vou dar-te
“Se a tanto me ajudar engenho e arte”
Uma antiga receita,
Que os rústicos instintos te deleita
E frémitos te põe na grenha hirsuta.
Leitor amigo, escuta:

Vai, como o padre-cura, cabisbaixo
Pelos vergéis da tua horta abaixo
Quando no mês de Abril, de manhã cedo,
O sol cai sobre as franças do arvoredo,
Para sorver aqueles bons orvalhos
Chorados pelos olhos das estrelas
Nos corações dos galhos;
Passarás pelas couves repolhudas
- Cuidado não te iludas,
Nem te importes com elas!
Vai andando...
Mas logo que tu passes
Ao campo das alfaces,
Pára, leitor amigo,
E faz o que te digo:
Escolhe dentre todas a mais bela,
Folhas finas, tenrinhas e viçosas
Como as folhas das rosas,
E enchendo uma gamela
De água pura e corrente,
Lava-a, refresca-a cuidadosamente.
Logo em seguida (e é o principal)
Que a tua mão, sem hesitar, lhe deite
Um fiozinho de azeite,
Vinagre forte e sal,
E ouvindo em roda o lúbrico sussurro
Da vida ansiosa a propagar-se, que erra
Em vibrações no ar,
Atira-te de bruços sobre a terra
E come-a devagar,
Filosoficamente, como um burro!

António de Macedo Papança, Conde de Monsaraz nasceu em Reguengos de Monsaraz a 18 de Julho de 1852 e morreu em Lisboa a 17 de Julho de 1913.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Dia-a-dia #136

Esta coisa de passar por anestesias gerais em operações tem que se lhe diga: na primeira operação onde fui submetida a isso, recordo-me que me fizeram perguntas que fui respondendo, do tipo mede 1.60, pesa xkg e etc... e no meio daquilo pediram-me para pensar numa ilha bonita, a que respondi que me estava a lembrar da  Ilha Farol na Ria Formosa. Lembro-me ainda que me perguntaram porque não pensava numa ilha nas Caraíbas e de responder que nunca lá tinha ido. Provavelmente adormeci e sonhei com a Ilha do Farol. Na operação da semana passada perguntaram-me as coisas do costume e no meio daquilo alguém comentou: tem a tensão 10-5 e a pulsação cardiaca a 70, tem um coração forte, isso é de corredora de fundo, pratica algum desporto? Eu respondi que não, que tenho de facto sempre a tensão baixa e o meu exercício cardiovascular é andar a pé. Ainda me lembro de perguntarem pelos meus 75 kg de peso e responder que estava correcto. Depois adormeci, provalvelmente sonhei que passeava nas ruas de Lisboa,  que é um dos pequenos  prazeres que tenho no dia-a-dia. E de certeza que estava confiante no meu coração de corredora de fundo para aguentar tudo.

domingo, 2 de dezembro de 2012

sábado, 1 de dezembro de 2012

terça-feira, 27 de novembro de 2012

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Poema #87

A MINHA QUERIDA PÁTRIA

a pátria
os camões
os aviões e os gagos-coutinhos
coitadinhos

a pátria
e os mesmos
aldrabões
...
recém chegados
à democracia social
era fatal

a pátria
novos camões
na governança
liderando
as mesmas
confusões
continuando

mesmo assim
as velhas tradições
de mau latim
da Eneida

enfim
sabem que mais?
pois
vou da peida

Mário-Henrique Leiria - " Novos Contos do Gin"

Natureza-Morta Social #5



 


quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Dia-a-dia #133

Mesmo há bocado vi uma boa natureza-morta social: um pombo a atacar um tabuleiro com restos de comida na esplanada da Gulbenkian, ao lado um papá com o filho ao colo, o bebé estava com um pijama branco com bolinhas coloridas. Que tonta, não tenho máquina fotográfica, dava uma boa pintura. Mas de facto, a realidade está sempre à frente da ficção.

Natureza-Morta Social #4




 


quarta-feira, 21 de novembro de 2012

terça-feira, 20 de novembro de 2012

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

sábado, 17 de novembro de 2012

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Dia-a-dia # 131



Mais uma "representação nacionalista" própria dos tempos contrubados em que vivemos, mas esta não envergonha ninguém em matéria de figuração, como video do prof. Marcelo, as carpideiras até vão muito bem com a parada. Entretanto, quando li isto fiquei no mesmo estado que esta carpideiras.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Dia-a-dia #130



Hoje em dia é melhor ouvir a opinião pública, é muito mais credivel que a opinião publicada. No dia 21 de Novembro às 19h vai haver um protesto pacífico em frente à Assembleia da Républica. Quem quiser participar leve o seu silêncio, uma vela e mostre a cara na luta contra a violência.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Dia-adia #129

Já começou a minha greve de juízo: hoje não mando bocas à múmia de Santa Comba Dão, nem ao lindo sobrolho do estalinista Álvaro Cunhal.

domingo, 11 de novembro de 2012

Dia-a-dia #128

Ora aqui está um local a visitar e ler com atenção:

PASSA PALAVRA


quinta-feira, 8 de novembro de 2012

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Dia-a-dia #125



NÃO DA PARA ACREDITAR!

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Dia-a-dia #124



Vitor Rua é um artista visionário, não é que ele já tinha composto uma música alentejana marciana, antes ainda da Nasa andar a analisar a águas de Cabeço de Vide?

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Dia-a-dia #123



Habitualmente digo que sou das terras do além, quando me refiro à minha origem alentejana. Fiquei agora a saber que afinal o Alentejo e Marte têm muito em comum e que a vida no planeta poderá ter origem em Cabeço de Vide, a Nasa anda por lá.


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Poema #88



OJOS, HERIDO ME HABÉIS...
Mote

Ojos, herido me habéis,
acabad ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.

Voltas

Pues me disteis tal herida
con gana de darme muerte,
el morir me es dulce suerte,
pues con morir me dais vida.
Ojos ¿qué os detenéis?
Acabad ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.

La llaga, cierto, ya es mía,
aunque, ojos, vos no querráis;
mas si la muerte me dais,
el morir me es alegría.
Y así digo que acabéis,
oh ojos, ya de matarme;
mas, muerto, volvé a mirarme,
porque me resuscitéis.


Luís de Camões

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Poema #87

O poço não é mar
a rua não é rio
janela não é castelo
o frio não é vazio.
O olho não é a lua
o barco não é peixe
caranguejo não é beijo
caravela não é vela.
A neve não é o lírio
o sorvete não é mel
sintoma não é suspiro
e folha não é papel.
Mariposa não é cor
laranja não é limão
ilusão não é amor
favo não é coração.

Salette Tavares – Espelho Cego. Lisboa: Edicões Ática, 1957.p.71

domingo, 14 de outubro de 2012

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Dia-a-dia #120

Este fim de semana fiquei a saber pelo Correio da Manhã que o Jorge Jesus fez um lifting, botox para ficar mais Camila Parker BOLAS. Ontem foi a notícia de que o adulto livro de poesia de Alice Vieira foi recomendado pelo Plano Nacional de Leitura para o 2º ano (crianças de 7 anos?). Hoje li isto. Mais um bocado e começo a acreditar no fim do mundo, como foi anunciado pelo calendário Maia.




sábado, 6 de outubro de 2012

Dia-a-dia #119

A cidadã Luisa Trindade ontem protestou nas restritas comemorações da Républica no Páteo da Galé em Lisboa, sendo retirada de lá pelos seguranças. Também a cidadã Ana Maria Pinto cantou "Firmeza" de Lopes-Graça, com poema de João José Cochofel. Alguns dos presentes aplaudiram-na.  Ambas encarnaram a Républica no 5 de Outubro de 2012, são o seu rosto actual. BRAVO mulheres lutadoras. Fica aqui o depoimento da cantora:

.«“Ninguém me ouve, ninguém me acode porquê?”

Gritava a Luisa Trindade, enquanto ecoavam ainda umas palavras do palco com tapete vermelho...A Luisa gritava, servindo-se inteiramente de si mesma e do seu desespero.

E estava ali eu com a Firmeza na mão...e era a Luisa que eu ouvia entre tantas palavras, A Luisa ali ao meu lado com Tudo de si mesma no coração, em grito.

Ouvem-se palmas, acabaram as palavras do outro lado...é a vez da esperança, é a vez da Luisa e do seu coração, rumo certo em si mesma, rumo certo em mim mesma.

Em forma de canto gritava agora eu: “...Que o teu corpo agora fale, presente e seguro do que vale...”

A Luisa exigiu, avançou, exigiu ainda mais ser ouvida..não chegou onde queria chegar... entretanto esvaziou-se o palco...entretanto cerraram-lhe o caminho...

E eu cantava “...Pedra em que a vida se aliceça...Pega-lhe como um senhor, e nunca, e nunca como um servo...”

Levaram a Luisa, e agora avancei um pouco eu...avancei com a Firmeza na mão, e com a Luisa no coração. E eu cantava:

“Canta os sonhos com que esperas, que o espelho da vida nos escuta!”

À minha volta ouviam...ouviam a música, ouviam a poesia e uma voz lírica...”caminho aberto, abriu-se caminho”...e no fim até bateram palmas. Bateram palmas a Luisa, o que ouviam era a Luisa, porque era a Luisa o coração de cada palavra...presente e seguro do que vale.»

Ana Maria Pinto



sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Dia-a-dia #118


Bandeira da República colocada do avesso. De acordo com os códigos militares, a bandeira ao contrário significa que o local está tomado pelo inimigo.


domingo, 30 de setembro de 2012

Dia-a-dia #117

Na terça-feira passada conheci o Manuel de Oliveira dos vinhos portugueses: o Barão von Bruemmer (Barão das Brumas) que nasceu em 1911 na Lituânea, fixando-se depois na Suiça Alemã onde trabalhou na banca e que aos 94 anos decidiu produzir vinhos na região de Colares. Visitei o Casal de Santa Maria, onde foram plantadas as vinhas mais ocidentais da Europa e provei os deliciosos  vinhos que sabem a mar. Fui com uma amiga que é especialista área, a visita foi guiada pelo enólogo António Figueiredo e depois conversamos também com o Barão, que está ali para as curvas. O que mais me surpreendeu foi que as vinhas foram plantadas ao lado das roseiras, porque são plantas que têm um ancestral em comum. Acontece que, em caso de doença, as roseiras ficam doentes antes das vinhas, protegendo-as assim. Maravilhoso, um caso onde a realidade está muito à frente da ficção.

Aqui e aqui estão as provas de que não é ficção.


sábado, 29 de setembro de 2012

Poema #86



Ó PASTOR QUE CHORAS

Ó pastor que choras;
O teu rebanho onde está?
Deita as mágoas fora!
Carneiros é o que mais há!

Uns de finos modos
Outros vis por desprazer:
Mas carneiros todos
Com carne de obedecer!

Quem te pôs na orelha
Essas cerejas pastor?
São de cor vermelha!
Vai pintá-las de outra cor...

Vai pintar os frutos,
As amoras, os rosais:
Vai pintar de luto
As papoilas dos trigais!

José Gomes Ferreira

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Dia-a-dia #116

A cgtp, o pcp e o bloco gostam de ser os detentores do monopólio dos protestos, isto cheira a estalinismo. E vivemos num país onde a taxa de abstenção oscila entre os 40% e os 60% da população. Bom, eu votei sempre em minorias porque acredito que são necessárias para o bom funcionamento da democracia. Já votei nulo como forma de protesto, gosto de desenhar bonecos nos boletins de voto. Fiquei ainda com menos vontade de ir à manifestação do dia 29 depois de ler isto. Mas vou protestar no dia 29 em Lisboa, com o movimento ACORDAI!. Vou cantar às 20h na Praça do Rossio. A outra manifestação é às 15h na Praça do Comércio.

Bom, entretanto, fiquei a saber que o movimento ACORDAI! também vai cantar às 15h na manifestação. E também às 20h, para que todos possam cantar. Já me devem considerar uma das más da fita, das que andam por aí a dividir para reinar. Acho que não vou.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Dia-a-dia #115

Neste momento vivemos em  democracia (aparente?). No entanto, o poder económico anda de mãos dadas com o político e estão acima do judicial. Todos os dias surgem nos jornais os casos de corrupção que não dão em nada. Existem diversas organizações politicas activas na sociedade portuguesa, existe eleições, o direito ao voto (com uma presentagem muito alta de abstenção), vários partidos politicos e sindicatos. É verdade, somos livres para nos expressarmos, as redes sociais assim o comprovam (e também pacificam as pessoas), as petições On-line que quase nunca dão em nada e recentemente as manifestações contra a troika, que foram expontâneas e apartidárias. Os organizadores destas manifestações apoiam a convocada pela CGTP no dia 29. Não os condeno, compreendo, mas dia 29 não vou à manifestação. Porque sou uma céptica, quem começou isto não foi a CGTP e desconfio de protestos onde estão demasiadas bandeiras de partidos politicos para o meu gosto. É uma opção individual, acredito sim em novos movimentos de cidadania com o movimento ACORDAI.


sábado, 22 de setembro de 2012

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Dia 21 de Setembro em Belém

Um coro de 400 pessoas vai amanhã oferecer música ao conselho de estado! E para que não restem dúvidas do que devem fazer, vamos presenteá-los com o Acordai do Fernando Lopes-Graça.


Hora de encontro: 17:30

Ponto de Encontro: fonte luminosa/CCB

Para melhor orientação sugere-se vestir uma t-shirt de uma cor diferenciada por naipe. BRANCO - sopranos; VERMELHO - Contraltos; AZUL - Tenores; PRETO - Baixos.


Se puderem, levem cópias da partitura. Ou só do texto.


Austeridade: “Acordai” é a banda sonora da concentração em Belém



quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Para aprender o ACORDAI

A partitura está aqui
Quem quiser ser massacrado com midis para ouvir a sua voz, pode ir aqui: http://www.comsonante.org/sites/default/files/acordai_1.pdf
E no youtube há algumas boas versões, como esta

A letra faz parte da descrição do evento. Seria bom imprimir e levar para distribuir.

Quem se junta à minha voz?
No dia 21 de Setembro, data do próximo evento da comunidade "Que se lixe a troika" ... que se "acendam almas e sóis neste mar sem cais"!
Local de encontro: Escadaria que dá para a fonte em frente ao CCB a partir das 17h30m

ACORDAI

Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras e o mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!

José Gomes Ferreira




Dia 21 de Setembro vamos cantar em Belém



Vamos cantar ACORDAI de José Gomes Ferreira e Fernando Lopes-Graça. O ponto de encontro é a partir das 17h30m na escadaria que dá para a fonte em frente ao CCB.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Dia-a-dia #114

Hoje de manhã fizeram-me uma colonoscopia: correu tudo lindamente, foi com anestesia e sedação, estava a dormir. Lembro-me que quando acordei relatei ao médico que tinha sonhado que a gata Lua tinha a solução para a actual crise mundial - especifiquei que era a minha gata siamesa. Que moca, acordei mesmo bem disposta!

sábado, 21 de julho de 2012

Leituras #28


Antes de deixar Coimbra, primeiro para, no Porto, leccionar num liceu da cidade, depois, já professor efectivo, para ensinar português e francês no liceu Mouzinho da Silveira, em Portalegre, José Régio viveu, na Alta, não longe da Rua Larga, ao tempo a antecâmara da Universidade, num desses típicos becos coimbrões, chamado, não sei porquê, Rua das Flores. De facto, flores não havia por ali, por aquele bairro de calçadas esboroadas, e muito menos as havia na pensão habitada pelo poeta, onde se instalara a primeira redacção da presença. (Mais tarde, em minha casa, em Santo António dos Olivais, e, por fim, depois de um efémero rés-do-chão, para esse efeito expressamente alugado na Rua do Corpo de Deus, à Baixa, no Porto, em casa de Adolfo Casais Monteiro.)

A pensão da Rua das Flores, 37, que suponho lá estará ainda, senão como pensão, como república ou casa particular, era um prédio alto – três andares – , muito estreito, quase enviesado, com duas janelas de frente, em guilhotina, claro está, e com pouco fundo, espécie de torre por onde trepava uma escada íngreme, de degraus carunchosos, que era preciso subir com muita cautela, tal a sua inclinação.

Ali José Régio passou, creio, os anos da sua formatura, e ali permaneceu ainda, com quarto privativo, algum tempo depois, aluno da Normal Superior. Prendiam-no lá, além da dona da casa, que não cheguei a conhecer, a criada para todo o serviço, a Carlota, modelo do desenho que ilustra a capa do número 22 da presença (Setembro-Novembro de 1929). Esta Carlota, «a que ficou sem par», na legenda do esquisso que Régio me ofereceu, e ainda conservo, tinha pelo Zé-Maria uma dedicação de cadela, embora não poucas vezes lhe arreganhasse caninamente os dentes. Rebarbativa e terna a um tempo, a Carlota levava os dias a lidar e a praguejar. Algumas vezes, sentada à mesa do refeitório da pensão – em parte modelo também da pensão de D. Felícia do Jogo da Cabra Cega –, pude assistir às reprimendas que a Carlota se não escusava de lhe dar, e Régio como que espicaçava, enquanto ele e os demais hóspedes – uns quatro ou cinco, julgo lembrar-me – comiam a clássica sopa de couves das velhas pensões coimbrãs. Tão alheio a qualquer conceito de higiene era, por esta altura, o viver dos estudantes em Coimbra, que a pensão da suposta D. Felícia nem mesmo dispunha de qualquer rudimentar casa de banho – que digo?, não dispunha, sequer de um W.C. No sótão, esconso, de telha-vã, é que os comensais resolviam os seus problemas, e num mesmo vaso, um alto bispote, como então se chamava a essa espécie de tulha de barro, de proporções reduzidas, «sanita» comum. Aí, nesse sótão de telha-vã, W.C. da pensão da suposta D. Felícia, é que José Régio arrecadava as sobras da presença, antes do meu regresso a Coimbra. Ora como, ao tempo, a nossa «folha de arte e crítica» era impressa no tal papel acetinado, como que de farmácia, e a ruma de folhas se acumulavam, imprudentemente, não longe do tal vaso higiénico – ou anti-higiénico –, aconteceu o que era de esperar. Alguns dos comensais da suposta D. Felícia, para não irem mais longe, e à falta de papel higiénico, luxo então desconhecido em Coimbra, pelo menos na Coimbra dos estudantes, muito à vontade, na altura própria, deitavam mão aos números da presença, abertos no soalho, em folhas devidamente acamadas, completando com elas, graças à sua acetinada calandra, a operação que ali iam fazer, ao sótão de telha-vã. Assim rarearam, a partir de certa data, os exemplares da nossa folha. Creio que Régio não dera por isso. Só deram por isso os que depois – Branquinho e eu – chamaram a si a administração da revista. Já era tarde. Mal empregados, vendem-se hoje esses números a peso de oiro.
João Gaspar Simões – José Régio e a História do Movimento da “Presença”. Porto: Brasília Editora, 1977. pp.78-80.


Da esquerda para a direita: José Régio, João Gaspar Simões, Albano Nogueira, Fernando Lopes-Graça e Adolfo Casais Monteiro.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Dia-a-dia #113

A minha irmã está preocupada com a hipótese de o número de gatos aqui em casa vir a aumentar. Acha que me estou a tornar numa excêntrica que apenas vive feliz em companhia felina

terça-feira, 17 de julho de 2012

Dia-a-dia #112

Ontem já muito tarde, depois de estar todo o dia fora, apareceu o gato Sunny muito mal disposto na porta do quintal: ele entrou e dirigiu-se à caixa de areia, reparei que não conseguiu urinar. Deitou-se e refilou com miados doloridos. Já era uma da manhã, acordei a minha irmã, coloquei-o na transportadora e fomos bater à porta da dona. A minha irmã revoltada, achava que ninguém me abria a porta, mas afinal lá apareceu a Ângela e também duas gatinhas bebés muito fofas. O Sunny entre o aflito e o zangado. O gato anda a embirrar com as gatinhas, por isso se passou para o outro lado do quintal e está sempre em minha casa. A Ângela lá me explicou a situação, que ele tem tendência a ter problemas urinários e que por isso come uma comida especial. E tinha tentado apanhá-lo  com as filhas, para o levarem ao veterinário, mas ele fugiu. O Sunny bufava ao colo da dona. Como sei que vão mudar de residência daqui a três meses, ainda lhe perguntei se não queriam deixar-me o gato e ouvi logo um NÃO. Bem, agora não o devo ver durante uns dias.

sábado, 14 de julho de 2012

Poema #85




RESPOSTA DA QUINTEIRA


Mote

Fui apalpar os tomates
Que tinha o meu hortelão,
Mostrou-me o nabal que tinha
Meteu-me o nabo na mão.

Glosa

Sou mestre na agricultura,
Tenho terra para cavar,
Gosto sempre de apalpar
Se a enxada é mole ou dura.
Ser amiga da verdura
Não são nenhuns disparates;
Enchi alguns açafates
De tomateiros de cama,
Depois de apalpar a rama
Fui apalpar os tomates.

As sementes tomateiras
Nascem por dentro e por fora,
Semeiam-se a toda a hora
Dentro de fundas regueiras.
Tão brilhantes sementeiras
Dão gosto e satisfação.
Dentro do meu regueirão
Dão-me as ramas pelos joelhos
Que tinha o meu Hortelão!

Só de vê-los e apalpá-los
Faz andar a gente louca,
Faz crescer água na boca
E a língua dar estalos.
Meu hortelão tem regalos
Tem hortaliça fresquinha;
No vale da carapinha
Tem um tomateiro macho,
Abriu-me as porta de baixo,
Mostrou-me o nabal que tinha.


Tinha grelos e nabiças,
Tinha tomates graúdos
Tinha nabos ramalhudos
Com as cabeças roliças
Tão brilhantes hortaliças
Meteram-me tentação;
Era franco o hortelão,
Deu-me uma couve amarela
Para me dar gosto à panela,
Meteu-me o nabo na mão.

António Maria Eusébio (Calafate) (1820-1911)

sábado, 7 de julho de 2012

Poema #84



BALOFAS CARNES


Balofas carnes de
balofas tetas
caem aos montões
em duas mamas pretas
chocalhos velhos a
bater na pança
e a puta dança.

Flácidas bimbas sem
expressão nem graça
restos mortais de uma
cusada escassa
a quem do cu só lhe
ficou cagança
e a puta dança.

A ver se caça com
disfarce um chato
coça na cona e vai
rompendo o fato
até que o chato
de morder se cansa
a puta dança.

Os calos velhos com
sapatos novos
fazem-na andar como
quem pisa ovos
pisando o par de cada
vez que avança
e a puta dança.

Julga-se virgem de
compridas tranças
mas se um cabrito
de cornadas mansas
abre a carteira e
generoso acode
a PUTA FODE.

António Botto

quinta-feira, 5 de julho de 2012

dia-a-dia #110


Afinal o gato Sol chama-se Sunny, que significa soalheiro, luminoso, cheio de sol, brilhante, radioso, dourado e risonho. Não se chama Tanny como me havia dito a vizinha Luzinha. Fiquei hoje a saber o seu nome ao falar com a dona no quintal, enquanto o convencia a ir para casa, que é do outro lado. Esta paixoneta entre o Sunny e a Lua já dura há três meses. A dona queixou-se que ele só aparece em casa de manhã, porque gosta de apanhar sol no pátio junto aos quintais. Agora estes dois vão-se separar durante uma temporada: a Lua está com uma inflamação pulmonar e ele também vai amanhã ao veterinário, anda aos espirros, mas é mais resistente. Ontem a Lua estava com febre e o Sunny não saía de ao pé dela, muito preocupado. A ver se ficam os dois bem de saúde para poderem brincar novamente.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Poema #83

segunda-feira, 2 de julho de 2012

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Dia-a-dia #116

Estava na biblioteca bem concentrada nas leituras quando me senti observada: reparei então que na mesa em frente, um peculiar rapaz me estava a desenhar. Já o tinha visto por ali, também no Chiado, deve andar nas Belas. Surpreendeu-me, não o censurei e deixei-me estar, encarando como sendo algo natural. Ele percebeu e continuou o desenho. A sensação foi estranha porque aquele olhar sabia perfeitamente o que estava a captar, os gestos eram precisos e sem indecisões. A estranheza derivou da troca de papéis, sei que por vezes faço isso com conhecimento técnico, com as mãos em acção no papel. Agora sou eu: tratava-se dum jovem apolínio, bastante andrógeno, que dá gosto olhar, mas não dá vontade nenhuma de mexer; tinha uma figura fora do vulgar, alto, robusto, elegante e vestia de negro; o rosto era demasiado desenhado e equilibrado, daí o apelidar de apolíneo; a andrógenia derivava do longo cabelo louro cendrê; também tinha umas patilhas horriveis, com um ar experimental próprio da idade; as mãos eram sensuais, os dedos compridos estavam sujos de grafite, mãos de trabalho que não devem parar quietas; as mãos seguiam o seu olhar verde-água, rasgado, de lince selvagem que me dissecou sem piedade. Por fim, levantou-se para ir buscar os livros, deixou o bloco de apontamentos na mesa aberto com o desenho terminado. Não consegui observar bem o desenho porque estava longe, mas deu para ver que registou o meu decote com prazer.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Amália Rodrigues - Fado Malhoa



A secretaria de Estado da Cultura anunciou hoje que a artista plástica Joana Vasconcelos vai representar Portugal na próxima Bienal de Veneza, em 2013.

Em comunicado, o secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, afirmou que Joana Vasconcelos nunca foi a artista convidada do pavilhão português no certame, mas que “está na altura de corrigir essa falha”. “Tem colocado o nome de Portugal ao mais alto nível no mercado mundial da arte”, justificou, acrescentando que as obras da artista, conhecida pelo seu trabalho de escultura, “levam ao exterior a marca identitária e tradicional de Portugal ao mesmo tempo que expressam uma modernidade assombrosa”.

Paulo Portas elogia Joana Vasconcelos

 


quinta-feira, 7 de junho de 2012

Poema # 82

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Dia-a-dia #115

Fui marcar uma colonoscopia que estou para fazer quase há um ano. Depois de renovar a credencial,que já estava caducada, lá descobri uma clínica que tem parceria com a ARS. Na clínica deparei-me com uma enorme fila no balcão de atendimentos. Olhei para a televisão e lá estava uma daquelas coisas que se passam à tarde, um velhote cantava um fadinho deprimente e como estava bem disposta comecei a imitá-lo baixinho. Ao meu lado começou-se a rir uma caboverdiana de idade indefinida, tanto podia ter 50  como 70 anos, com umas bochechas amorosas. Comentou logo que o homem da TV cantava muito mal, e continuou a rir-se com ar de miúda traquina. Atrás dela estava o marido que era alto, magro e com um bigodinho muito composto. À minha frente estava uma senhora a levantar o exame do filho, e pediram-lhe para pagar mais 100 euros por causa de terem retirado um polípulo. A caboverdiana olhou para mim preocupada, dizendo que a senhora se calhar não tinha dinheiro, mas afinal, um homem que estava ali perto sentado - talvez o marido -  sacou das notas e pagou. Chegou a minha vez e fiquei a saber que tinha de deixar um sinal, apesar de só ir fazer o exame em Julho - para além da taxa moderadora, vou ter de pagar 150 euros pela anestesia, uma roubalheira, porque apenas me colocam a dormir, provavelmente  com um Valium e mais umas gotinhas de Tramal. E como não havia multibanco, fui levantar dinheiro lá fora. Já no multibanco, deparo-me com uma moeda de um cêntimo no meio do chão, apanhei-a porque achei que me ia dar sorte. De volta à clínica, encontro o casal caboverdiano à porta, ela não estava com boa cara. Mostrei-lhe a moeda de um cêntimo e contei-lhe que a tinha encontrado no chão. Ela queixou-se que o marido estava desempregado, mas tinha pago taxa moderadora, porque faltava documento. Coloquei-lhe então a moeda que encontrei na mão dela, segurei-lhe a mão e disse-lhe para  não se preocupar, que a moeda lhe traria boa sorte. Ela agradeceu e voltou a sorrir com ar de miúda traquina.

Ilustração #34

 


 


Ésquilo - "Agamémnon". Lisboa: Edições Artefacto, 2012
Imagens da capa e contra-capa da minha autoria.

sábado, 2 de junho de 2012

Dia-a-dia #114


O gato Sol teve hoje uma experiência nova: estive toda a manhã a pintar e a ouvir a Antena 2. Ele aparentemente reagiu bem, dormiu no sofá ao pé de mim, até que reparei que acordou assustado: na rádio Puccini e as pinturas estavam no chão a secar. Ele saltou e foi cheirá-las desconfiado. Depois olhou para mim e dirigiu-se para a porta do quintal, que abri para o deixar ir à sua vida. Deduzo que não gostou nem de Puccini, nem das minhas pinturas.