PASTORA DESCRITA
Eu, pastora, que apascento
estrelas da madrugada
pelas campinas do vento,
fui falar ao eco antigo
a cuja voz fui criada,
e que supus meu amigo
“ Sou sempre a de antigamente”,
murmurei-lhe, enternecida.
E ele anunciou longe: “ Mente!”
Mas era a minha verdade
e, vendo-me assim descrita,
padeci com a falsidade.
“ Eco amigo, eu não te iludo:
pastora sou destes prados
onde se confunde tudo;
mas sou de ontem e de agora,
dentro dos despedaçados
instantes de nenhuma hora…
A amargura não me aumentes…
E o eco antigo, infiel e exato,
repetiu-me perto:” Mentes…”
Vergada em móveis espelhos
vi nas águas meu retrato,
chorei sobre mim, de joelhos.
Mas o gado que pascia
pelas colinas da aurora,
mascando as margens do dia,
veio a mim sem que o esperasse
lambeu-lhe os olhos de outrora,
- reconheceu a minha face.
Cecília Meireles
O que procuro em ti, eco ou planície, que não me respondes? Porque devolves apenas a minha voz?
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário