Mar
Levaste-me a ver o mar, o areal da praia grande. Disse-te que aquele era o meu mar, que me atormenta os sonhos. Contaste-me que o teu mar estava ali perto, na Ericeira. Eu relatava-te acontecimentos absurdos para te fazer rir. Víamos o mar no grande areal ao longe:
- Só me contas histórias fantásticas, já pensaste em escrevê-las?
Eu não escrevo, pinto, tu é que escreves. As imagens são mais imediatas, elas invadem o interior do cérebro, silenciosamente. Pensa bem: o que é mais rápido, o trovão ou o relâmpago? Um fenómeno apenas, surgindo no mesmo espaço-tempo, a descarga de energia eléctrica na atmosfera terrestre. A ciência descodifica a invisibilidade deste fenómeno, através do cálculo matemático é possível uma aproximação à ordem da natureza. E como é que a natureza nos revela o fenómeno? A luz invade a atmosfera e segue-se o trovão. A velocidade da luz é superior ao som, o som é uma espécie de sombra da imagem. As imagens são velozes e silenciosas, a língua segue-as, fantasmaticamente, de forma ameaçadora. O som estremece o chão dos meus pés nas trovoadas de Sintra.
Texto publicado em "Bicicletas para memórias e Invenções", Ed. criativação, Lisboa, Dezembro 2006 e postado no Insónia a 21/8/2005, a ilustração foi postada a 20/10/2006
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