O que procuro em ti, eco ou planície, que não me respondes? Porque devolves apenas a minha voz?

sábado, 12 de junho de 2010

Eco sitemeter #3

Alguém chegou a esta casa no tempo à procura eco textos e encontrou A casa escreve-me descrevendo , por isso, achei que deveria escrever um eco texto:

ECO TEXTO

A casa escreve descrevendo-me: as paredes amarelecidas pelo tempo foram pintadas de branco, permanecendo as amarelas camadas de memória invisíveis; cada paixão em cada camada de tinta nestas paredes, sei que elas existem e o branco tapa-as reflectindo a presente luz natural. A minha casa continua a ser uma conquista no tempo, mas os seus espaços foram invadidos por outras circunstâncias; o tempo continua a consumir as suas paredes e vai-me consumindo como Cronos devorou seus próprios filhos. O restauro foi eficaz, não apagou tudo e o esquecimento foi necessário em matéria de sobrevivência; agora, as paredes brancas criam ressonâncias, dando origem a um eco texto. Ocupo um pequeno território nesta casa e habito bibliotecas grande parte dos meus dias. As paredes da casa no tempo têm os mesmos rastros, preenchidos com os meus artefactos antigos, são as janelas do passado, mas entretanto foram abertas novas janelas; o chão de madeira, os frisos geométricos junto ao tecto continuam e a casa tornou-se um porto de passagem nocturno; aqui regresso para descansar sem grande sossego. Os meus papéis e livros amarelos estão sempre presentes e também há novos livros novos papeis, que deixam de ser brancos; e não apenas aqui à minha volta, saem à rua, vão e voltam comigo. As chaves de casa, antes de sair procuro-as sempre, ou estão na cozinha, ou estão na sala, ou no quarto, ou na marquise, é sempre a mesma coisa, tenho de as encontrar para poder sair e voltar à casa. As chaves obrigam-me a percorrer todo o espaço antes de sair. Nunca sei onde estão os óculos, se não os deixo no nariz ou ao lado do computador, repete-se o ritual da ronda à casa, à casa de banho, à cozinha, ao quarto, à sala. Não me perco nisto. A casa esconde-me as coisas, as canetas, os lápis, os cadernos, os livros, os sapatos, mas não se apodera de mim de forma alguma, porque o tempo decorre para além do espaço das suas janelas.

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